O presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), Carlos Baigorri, levantou críticas à forma de bloqueio das casas de apostas ilegais no Brasil. Em entrevista à Folha de S.Paulo, ele defende que a Agência precisa de ferramentas legais e tecnológicas mais aprimoradas para conseguir efetivamente bloquear as bets ilegais. Sob as regras atuais, o órgão não consegue garantir a medida.
Segundo Baigorri, “do jeito que está hoje, a gente está enxugando gelo, e o bloqueio que tem é muito pouco efetivo”. Isso ocorre porque as dificuldades são de diversas naturezas. Primeiramente, a forma que o bloqueio foi pensado é pelo endereço IP – ou seja, a sequência de números como 172.217.11.142 que são os verdadeiros endereços das páginas web na internet. Como complementar, o endereço “www.com” que aparece na verdade faz parte do Domain Name System (Sistema de Nomes de Domínios, ou DNS). Este funciona como uma lista telefônica digital, que traduz nomes de sites que digitados no navegador (como www.google.com) em endereços IP numéricos.
Atualmente, o bloqueio funciona da seguinte forma: a Secretaria de Prêmios e Apostas da Fazenda manda a lista de bets ilícitas para a Anatel. A partir daí, o órgão notifica as provedoras de internet do país (como Vivo ou Claro) para que bloqueiem o acesso ao endereço IP.
Porém, nada impede que as bets solicitem às empresas operadoras de DNS que substituam o endereço IP associado ao domínio, o que faz com que o site funcione normalmente. Algumas casas ilícitas também têm apenas criado novos domínios para continuar em atividade.
Isso significa que todos os 5.200 sites banidos podem voltar à ativa por essa manobra, o que levaria o Executivo a ter que identificar novos números IPs para criar uma nova lista e começar o processo do zero.
Segundo Carlos Baigorri, a Agência enviou uma medida provisória (MP) para os Ministérios da Fazenda e dos Esportes visando aprimorar a regulação e conceder poder de polícia administrativa sobre os operadores de DNS.
Dentre as alternativas para o sistema atual, existem:
- A ampliação dos poderes da Anatel, permitindo que esta regulamente, fiscalize e sancione os operadores de DNS;
- Alterar a lei das bets para ampliar o parágrafo que trata de bloqueios, para incluir a obrigatoriedade do cumprimento por estes operadores;
- Modificar o Marco Civil da Internet para ampliar as diretrizes de bloqueio de sites.
“Se o Estado quer ter algum poder de mando no ambiente da internet, esses agentes precisam também estar submetidos ao controle do Estado”, diz Baigorri.
Não há como garantir bloqueio a casas de apostas ilegais
Ainda com as mudanças sugeridas pelo presidente da Anatel, esta não tem como assegurar o cumprimento dos bloqueios.
“A gente comunica todas as empresas de telecomunicação. São 20 mil, grosso modo, porque a gente está falando das grandes, mas [também] essas pequenininhas do interior do Brasil. Quando você fala de 3.000 sites em 20 mil redes, são 60 milhões de verificações. Hoje, a gente não tem como garantir que o bloqueio está sendo efetivado”, reconhece Baigorri.
A agência tem concentrado seus esforços em fiscalizar as grandes operadoras, que representam entre 80% e 90% dos acessos dos usuários na internet, mas não tem recursos para alcançar os 100%. Seriam necessários R$ 7,5 milhões para aplicar uma ferramenta tecnológica que aprimora o acompanhamento das suspensões, mas o recurso não foi obtido.
Ineficiência pode afetar mercado regularizado
Baigorri prevê que a ineficiência do bloqueio pode criar problemas para o mercado legalizado, já que empresas que estão operando na regularidade, inclusive pelo pagamento de outorga, podem se sentir prejudicadas.
Para o presidente da Anatel, a solução ideal combina aprimoramentos na legislação e ações externas que diminuam o apelo das casas de apostas ilegais, criando dificuldades de acesso e bloqueando meios de pagamento.
“Imagina, você coloca o dinheiro numa bet que é irregular, no dia seguinte o site está fora do ar. Por mais que daqui a duas horas ele volte, naquelas duas horas seu dinheiro tinha sumido. Eu não tenho como extirpar da realidade a bet irregular, mas eu vou fazer ela ser tão ruim que ninguém vai jogar nela.”
Carlos Baigorri adverte ainda que não seria efetivo para coibir as apostas no Brasil revogar a lei das bets ou tentar criminalizar o mercado: “Não tem como colocar o gênio de volta na lâmpada.”
Por fim, o modelo de regulação adotado também foi criticado pelo presidente da Anatel, com visões distintas e não unificadas entre a SPA (Secretaria de Prêmios e Apostas), ligada à Fazenda, com ênfase na tributação, e a pasta do Ministério dos Esportes, voltado para a integridade esportiva.
“Se você quiser seguir o livro-texto de regulação, primeiro [precisa de] um colegiado, não é um cara sozinho. Depois, toda regra que for fazer tem que ter análise de impacto regulatório, consulta pública, discutir com os agentes. O pessoal decidiu regular, mas não está seguindo o livro-texto da regulação”, finalizou Baigorri.
Fonte: Folha de S. Paulo
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